Depoimentos

 

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PERDIDOS NA NOITE...

Era para ser uma festa. Na verdade era uma festa. Um amigo em comum (Sávio) ia fazer uma grande comemoração na chácara de sua família nos arredores de Goiânia e nos convidou (eu e o Flávio Maciel – MG). Pode ser que tinha mais gente, mas não me lembro muito bem.
Como tínhamos uma equipe chamada Arco-Íris, éramos eu, Flávio, Messias (GO) e o Thales (MG). Se saltamos os quatro eu, sinceramente, não me lembro e de antemão me desculpo com os colegas se foi todo mundo. A idade.... Seria um salto noturno. Fomos visitar a tal da chácara durante o dia para, vocês sabem, ver o diabo do lugar. Tudo parecia lindo. Lugar agradabilíssimo, casa grande, campo de futebol, churrasqueira, cachorros gigantes, etc. – o básico. Olhamos onde poderiam existir obstáculos. Nada preocupante: casas com muros de 3 metros de altura, fiação elétrica aérea da década de 50 (1950 e não 1850 !), árvores e um rio. Tratava-se do rio Meia Ponte, que permeia a cidade de Goiânia e dessa recebe tudo que não queremos mais e sai pelo esgoto. A chácara fica na margem direita do rio. Do outro lado existiam várias outras chácaras, mas com muita pastagem e poucas árvores. Toda a malha viária era de terra. Um verdadeiro labirinto. Em todo caso, conversamos com o Sávio e combinamos tudo. Haveriam 10 a 12 carros com os faróis acesos apontando para o centro do campo de futebol. Saímos dali para combinar com o piloto. Vento, altura, tudo checado. Era o dia 4 de maio de 1985. Decolamos do Aeroclube de Goiânia (escolinha -Aeródromo Brigadeiro Eppinghaus) por volta das 19 horas em um Cessna 182 (PT- JIL). Vai lá, vem cá e onde estava a maldita chácara? Se lembram do jogo “Onde está Wally?”. Parecido. Cagaço? Bobagem. Afinal, éramos pára-quedistas! Equipamento Cruislite (state of the art). Já estávamos a 5.500 pés e nada de ver a maldita chácara. Lembram do labirinto? Pois é, imbecilidade nossa achar que tudo estaria apagado e só os carros na chácara chamariam a atenção. Noite escuríssima, sem lua. Após ponderar se abortávamos ou não o salto vimos, ao longe, uma iluminação diferente – sei que esse termo é muito geral, mas poderia ser também uma praça. Era a chácara! Mistura de excitação e cagaço, nos preparamos, e advinhamos o vento (não dava para ver a biruta – alguém colocou-a atrás dos carros e no escuro). Marcamos uma passagem e fomos ... literalmente. O vento nos carregou para o lado oposto da chácara, com uma força muito grande. Qualquer esforço para tentar chegar perto da chácara já era. Nisso, eu e o Flávio já estávamos próximos e resolvemos fazer um TRV (alguém ainda lembra o que é?). Sem desafiar as leis da física, reparamos que estávamos caindo, mas onde? Devido à proximidade (por causa do TRV) conversamos o tempo todo para decidir onde aterraríamos. Conversa vai e o chão vindo. Foi quando o Flávio gritou que havia uma diferença no escuro do solo (lembrem que disse que estava mais escuro que tubulação de convento). Era uma “coisa” parecida com uma estrada. Realmente era cinza escuro, em contraste com o preto absoluto. Era ali mesmo. À medida que o chão chegava, ou melhor, que chegávamos perto do solo, o que era uma estrada...não era ! Na verdade era o rio Meia Ponte !!! Tivemos uns dos reflexos mais rápidos da história do esporte ! Um gritou (o outro pensou): Fora! Fora! Foi a conta de quebrarmos o TRV e aterrarmos no barranco do rio, em um pasto. A lógica e nossa educação universitária nos favoreceram com o palpite que teríamos que andar ribanceira acima e buscar ajuda. Outra falha de memória (não rara esses dias!) é que realmente não me lembro se tínhamos uma lanterna. Aquelas sinalizações boiolas de equipamento sim, mas para nos movimentar naquele pasto era inútil. Andando naquela noite, depois do cagaço, é claro, começamos a rir – completamente perdidos na noite ! Embolamos o velame debaixo do braço e saímos à procura de ajuda. O fato mais inusitado e desconcertante ainda estava por vir. Esqueci-me que em chácaras, não raro, os donos possuem animais (tipo vaca, ok?) e usam cercas de arame farpado (também para separar propriedades). Bem, no mesmo passo que estava peitei (literalmente) uma cerca de arame farpado de 6 fios! Nenhum problema aparente. Me soltei vagarosamente, sem fazer muito alarde, com ódio da imbecilidade que havia cometido. Depois de algum tempo nos resgataram e tivemos que aturar as humilhações pertinentes ao fato na chácara do Sávio. No entanto, quando chegamos o Sávio olhou para nós e disse: “ Nelson, o que aconteceu com seu macacão?! ” Sem entender, olhei para meu peito e lá estavam as marcas dos fios do arame farpado, que haviam atravessado o tecido e furado a pele, fazendo um desenho perfeito de pontinhos vermelhos de sangue. Nada grave, mas, convenhamos, ridículo de engraçado.
A segunda fase do riso veio quando cheguei em casa e tive que explicar para todos o ocorrido.
Perdidos na noite....

                                                                                                                          Por 
                                                                                                                                   Nelson Jorge da Silva Jr